3 de jan. de 2008

Dias passados

O dia ia morrendo lá longe. As estrelas, ainda tímidas, saíam aos pares da coxia celestial para dançar pelo palco do firmamento. A mesa, antes posta com tanto esmero, se assemelhava agora um campo de batalha com manchas de vinho e pedaços do cabrito espalhados por todos os cantos.

Peguei o meu copo de vinho tinto e procurei uma espreguiçadeira afastada do fogo. O céu estava bonito naquela noite de dezembro. O fogo crepitava alto e iluminava o rosto de todos. Um tio tocava modinhas na velha viola caipira, as crianças corriam ao redor das chamas e os cachorros que mastigavam os espólios da ceia enquanto as mulheres arrumavam a casa. Tudo como era antes. E como deveria ser.

Conversavam sobre causos da cidade e do campo. Um se lembrou das exibições clandestinas de filmes pornôs que uma varejista oferecia aos clientes em Itaoca. Já outro se recordou do caso do ladrão que abriu um cofre com os pés para não ser identificado pelas digitais em outra cidade do interior brasileiro.

Eu apenas ouvia de relance as histórias. Via as belas estrelas que dançavam e bebia meu copo de vinho gaúcho. E pensava Nela.

A viola foi silenciada por um rugido que vinha da casa pedindo ajuda para ligar o som. O dono da casa deu o último gole na taça de champagne e foi ajudar a mulher. O violeiro cedeu o instrumento para um dos amigos do dono. O som agora era um antigo e belo choro sobre as malocas da sinuosa São Paulo dos anos 30.

Uma das primas, que conseguira fugir da arrumação, puxou uma cadeira e perguntou o que eu estava pensando para estar tão calado. Respondi uma banalidade qualquer e ela puxou a cadeira para perto do fogo.

E a noite passou devagar. Entre sambas, choros, canções modernas e fígados destruídos, sobrevivemos todos.

O sol veio devagar. Iluminando tudo; revelando o que a noite teimava em esconder. O último acorde morreu com os gritos matinais do galeto. As estrelas, exaustas de tanto bailar, voltavam para a coxia celestial para uma boa noite de sono. E eu continuava a pensar Nela.

4 comentários:

Anônimo disse...

Belo texto ;-)

Bruno de Pierro disse...

muito bom o texto, max! bem diferente do que vc costuma escrever!..continua assim..hehe..abç!

João Paulo Caldeira disse...

uau, tá todo mundo meio melancolicamente apaixonado, eu hein...

Anônimo disse...

XD...

Deve ser porque eu to escrevendo de madrugada...